Transformei alguns livros em ícones, o que deixou mais difícil ainda lê-los, já que ganharam uma aura de especial, de clássico, de difícil. Madame Bovary era um deles e consegui transpô-lo.
No fim, fiquei maravilhado com o livro. Madame Bovary não tem nada a ver com Luísa. Madame Bovary é maldosa, engenhosa, além de se mover pelas paixões, ela tem uma razão nos seus movimentos que deixa Luísa no chinelo. Madame Bovary é capaz de enganar o marido dizendo que vai ter aula de piano em outra cidade para se encontrar com o amante, enquanto Luísa no máximo foge para o Paraíso com Basílio.
Além do mais, Madame Bovary teve dois amantes e ainda fez amor numa charrete! Madame Bovary quis morrer e se matou; continuou enganando Charles desde o túmulo. Luísa, simplesmente morreu louca e careca. Emma foi para o túmulo mais bonita do que quando era viva, mesmo se suicidando com arsênico. Sem contar que Emma não se deixou nem chantagear, nem se prostituir, se suicidou porque estava endividada, claro que tinha remorso, mas não foi só o remorso que a matou, como matou Luísa.
Agora a descrição de Charles é fantástica, talvez ela valha mais do que a da própria Emma. Acho que a grande crítica nem seja o Romantismo em si, mas sim o que leva as pessoas aos ardores Românticos.
No fim, talvez a burguesia portuguesa fosse mais pudica e menos cosmopolita que a francesa (tese bem trabalhada em Os Maias), mesmo que ainda seja este retrato da burguesia francesa seja a de uma burguesia de província. Mas é fantástico como o dinheiro vai entrando em todos os detalhes e como a ausência de comentários pode insinuar uma conduta moral forte.
Foi uma pena ter lido conto do Woody Allen em que ele traz Emma para Nova York antes de ter lido Madame Bovary. Se tivesse feito na sequência certa o conto seria ainda mais engraçado.
O livro merece ser lido, de alguma coisa serviu andar tanto de ônibus.